Palestra do Prof. Leandro Karnal abre o 3º Simpósio de Práticas Inovadoras do Colégio Medianeira
O historiador propôs reflexões sobre tradição e inovação, a centralidade do cuidado no trabalho docente e a necessidade de formar mentes críticas em tempos de aceleração digital.

O Colégio Medianeira deu início ao 3º Simpósio de Práticas Inovadoras com uma palestra de abertura conduzida pelo historiador e professor Leandro Karnal. Destinado aos educadores da instituição, o evento abordou os desafios da escola jesuíta no século XXI, destacando a importância da prudência diante da tecnologia e da preservação de valores permanentes. Karnal, que compartilhou ter uma ligação afetiva com o Colégio — onde morou por um mês em 1981 durante um estágio como noviço jesuíta — iniciou a discussão refletindo sobre a tensão entre o digital e o analógico na educação contemporânea.
Diante da presença constante das redes sociais e das diferentes inteligências artificiais, um dos grandes desafios do ensino é compreender o que deve ser integrado às práticas pedagógicas e o que pode ser dispensado. Karnal aponta que há dois erros comuns diante da inovação: “um deles é a nostalgia, acreditar que tudo era melhor no passado. A nostalgia revela, na verdade, um desajuste diante do novo. O outro erro é endeusar o moderno, supor que tudo que é novo é bom. É necessário selecionar com equilíbrio e inteligência o que essas novidades trazem, sempre alinhadas aos valores e à filosofia educacional”, ressalta.
O historiador destacou ainda que, na década de 1990, muitas escolas acreditavam que a presença de computadores em sala tornava o ensino moderno. “A presença da Bíblia não transforma o ambiente; é preciso lê-la. A presença da tecnologia também não muda o ensino; é preciso utilizá-la com propósito. É possível fazer um excelente ensino sem tecnologia e, ao mesmo tempo, oferecer um ensino ruim com todos os recursos digitais. O que define a qualidade é a filosofia educacional”, afirma.
Comentando a Lei nº 15.100/2025, que proíbe o uso de aparelhos eletrônicos portáteis pelos estudantes durante aulas e intervalos, Karnal afirma ser favorável à medida, mas alerta que a ação vai além da simples proibição. “Na minha geração, não podíamos usar calculadoras eletrônicas no Ensino Médio, pois elas impediriam de aprender a fazer cálculos complexos. Então, eu não usei e eu não sei fazer cálculos complexos. Ou seja, eu abri mão de uma tecnologia em nome de uma de um princípio que não foi implementado. O mesmo ocorre com o celular: abrir mão da tecnologia pode ser positivo, desde que o objetivo seja aumentar a atenção, a leitura e a interação dos alunos”, lembra.
Para exemplificar os riscos do uso das telas, Karnal citou a experiência da Finlândia, que adotou a tecnologia no ensino fundamental, mas abandonou seu uso universalizado ao perceber impactos negativos na motricidade fina, na capacidade de leitura de microexpressões e até no desempenho cognitivo dos alunos.
A ética e o Amor Ágape na educação
Retomando a tradição da educação católica jesuítica, o professor enfatizou que a ética é um valor que deve atravessar a história, diferenciando-se dos fatos momentâneos que distraem os alunos. Ele destacou a importância da adaptação cultural — como a Companhia de Jesus fez ao se deparar com os ritos chineses — para que os educadores possam manter a essência dos valores mesmo transformando as formas de ensino.
Karnal caracterizou a prática docente como um ato de “amor ágape”, um amor altruísta, incondicional e voltado para o bem do outro, que busca transformar a vida dos alunos sem esperar gratificação imediata. “O foco do professor deve estar no aluno que mais precisa, no ‘fundão’ da sala, e não apenas naquele que já se destaca. A pedagogia do amor é a pedagogia da insistência. A escola deve ser um espaço de fomento à tolerância ativa, valorizando a diversidade, mas sempre respeitando a ética e a lei”, destaca.
Momento de formação para educadores
Para o Diretor Acadêmico, Carlos Torra, a palestra de Karnal reforçou a importância da troca de experiências, da prática colaborativa e da construção de uma educação inovadora baseada no discernimento coletivo. “Quando compreendida como expressão da fidelidade criativa, a inovação deixa de ser apenas técnica ou metodológica e se transforma em um exercício de escuta, diálogo e corresponsabilidade. Cada educador torna-se sujeito ativo na missão educativa, promovendo projetos pedagógicos significativos e integradores”, afirma.
Sendo assim, o trabalho colaborativo se fortalece como lugar de formação contínua e de aprofundamento da identidade institucional do Colégio. “Dessa forma, juntos, podemos responder com maior coerência e criatividade aos desafios educativos do tempo presente, mantendo viva a centralidade da pessoa e a busca do bem mais universal”.
O Simpósio, segundo Carlos, também fortalece o trabalho colaborativo como espaço de formação contínua e de aprofundamento da identidade institucional do Colégio Medianeira. “A inovação, em nosso contexto, não é um modismo pedagógico, mas consequência da formação integral dos educadores. Por meio dessa reflexão crítica e comprometida, o educador se torna capaz de recriar, em cada prática e relação, o modo de proceder educativo da Companhia de Jesus”, conclui.
Para o Pe. Agnaldo Duarte, Diretor Geral do Colégio Medianeira, a reflexão do professor Leandro Karnal sobre a Escola Jesuíta no século XXI reafirma o modo de fazer educação com base em uma profunda compreensão da missão jesuíta. “Desde suas origens, os jesuítas cultivam uma forma de educar que une significado e significante, experiência e cultura, espiritualidade e conhecimento. Essa tradição expressa sensibilidade e constante busca por caminhos de diálogo e aproximação, envolvendo toda a comunidade educativa em um processo compartilhado de aprendizagem”, destaca.
Segundo Pe. Agnaldo, a fala de Karnal convida à reflexão sobre o papel da escola jesuíta como espaço de formação integral. “Nessa perspectiva, educar vai além da simples transmissão de saberes: significa formar pessoas conscientes, livres e solidárias, capazes de transformar a sociedade. Essa visão se alinha a princípios fundamentais da pedagogia inaciana, como o magis e a cura personalis, que valorizam a excelência entendida não apenas como desempenho acadêmico, mas como plenitude humana e compromisso ético”, conclui.
3º Simpósio de Práticas Inovadoras do Colégio Medianeira
A terceira edição do evento reuniu 39 trabalhos inscritos, entre oficinas e comunicações, envolvendo mais de 90 autores e coautores. A experiência promoveu a troca de saberes entre educadores e estimulou reflexões sobre os desafios da educação contemporânea, valorizando a inovação, a colaboração e o desenvolvimento integral de cada estudante.