Pequeno ensaio sobre a simplicidade
“Qualquer que seja a sua condição em matéria de dinheiro e crédito, você não vai encontrar num shopping o amor e a amizade, os prazeres da vida doméstica, a satisfação que vem de cuidar dos entes queridos ou de ajudar um vizinho em dificuldade, a autoestima proveniente do trabalho bem-feito, a satisfação do “instinto de artífice” comum a todos nós (…).”
(Zygmunt Bauman in: A Arte da Vida p.12)
Li, já faz algum tempo, o livro do qual retiro o excerto acima, que resolvi transformar em epígrafe deste post. As reflexões feitas por Bauman neste livro voltaram à tona, com certa intensidade, depois de ter peregrinado por algumas cidades muito pequenas na região de fronteira entre Paraná e São Paulo, recentemente.
Saí de Curitiba com a bagagem de quem parte de uma metrópole, totalmente inscrita na pós-modernidade, com ritmo e trânsito caóticos e com o isolamento garantido de quem é só mais um na multidão (Baudelaire). A tarefa de descansar na “paz do campo”, em um lugar que “não tem nada”, parecia-me então, muito simples. Ocorre, porém, que eu não estava de fato preparada para ver, ouvir, sentir, algumas coisas, que não só me impactaram como também impuseram uma série de questionamentos.
Engana-se você caro leitor, se espera que eu revele alguma experiência mágica ou mística, nada disso. O impacto veio de coisas muito simples e distantes da minha vida urbana. Vi o acolhimento sincero das pessoas, que não fizeram conta do fato de eu ser uma completa estranha, vi incontáveis estrelas, que são diariamente ofuscadas pelas luzes da cidade, vi água potável brotando das pedras. Aprendi que é pela fumaça branca que se sabe o ponto exato da torragem do café, que carinhosamente prepara-se para presentear os visitantes. Aprendi que o marrom da casca do ovo tem tons diferentes, que revelam sua qualidade. E ouvi o som dos bambus, que gemem e estalam de acordo com o vento, impressionante obra sonora. Descobri que o arroz e o feijão têm outro sabor, que eu não sei explicar, só sei que é bom. Conheci um novo tipo de cravo e provei a pimenta mais saborosa, suave e marcante como nossa anfitriã.
Vi serem desfiadas lembranças que tecem e enredam a história de várias gerações de uma mesma família, que reproduz no universo micro uma parte da história do nosso Brasil, o êxodo rural, a busca “por uma vida melhor” nas grandes cidades e o refúgio sazonal no lugar de origem.
Com tudo isso, que não é pouco, ao fazer as malas e pegar a estrada de volta, trouxe na bagagem um pouco de café e alguns pontos de interrogação. Quais são, de fato, nossas necessidades? Do que precisamos para viver? Quantos de nossos desejos são mesmo nossos e quantos são fabricados?
Como lá não pega internet (e nem celular), este post não chegará até eles, fico sem saber se quem vive lá tem noção das suas riquezas, talvez não, pois a televisão (que já chegou lá) talvez já tenha conseguido ensinar que felicidade “se compra com Mastercard”.
Juliana Heleno