26.08.10

Reabilitar a política

Em tempos de eleições, muita gente se pergunta se ainda vale a pena acreditar na política. A cada dois anos, uma infinidade de candidatos a desfilar pelo horário eleitoral – cá entre nós, um mais exótico do que o outro – mais uma sequência de números a decorar, mais uma visita à mesma seção eleitoral e aquela sequência de números decorados prontos para serem transferidos para o teclado da urna eletrônica. Bate uma leve dúvida. Afinal, serão mais quatro anos, não é? Toda a responsabilidade política de um cidadão pesa (ou não) neste momento.
Bom… confesso que eu fui, por duas eleições (minha primeira, aos 16 anos, para a escolha dos representantes na esfera municipal, e a segunda, aos 18 anos, para os cargos estaduais e federais) o típico eleitor retratado no parágrafo acima. E como eu me orgulhava disso. “Veja só! Quase todos os meus candidatos foram eleitos… Cumpri o meu papel de cidadão!” (ah… se arrependimento matasse!). Até que, aos 19 anos, deparei-me com um famoso texto da vasta literatura social brechtiana, e com ele descobri que “o pior analfabeto é o analfabeto político”. Aquilo foi para mim como uma chuva de inverno, daquelas que cortam a pele sem deixar cicatriz: eu que pensava que sabia ler, tive a consciência súbita de que, desse alfabeto, eu não conhecia sequer o A.

Aprendi, a partir desse dia e com a ajuda de muitos amigos que passaram pela minha vida fazendo “boa política”, que não se decora número em véspera de eleição. Aliás, que o simples fato de “decorar” o número do seu candidato mostra o quanto se está despreparado para uma eleição. Hoje, os números dos candidatos aos quais confiarei meu voto já estão gravados na minha consciência como que por “osmose”. Alguns eu conheço pessoalmente, e às vezes mais que isso: convivo com dois ou três nas mesmas lutas nossas de cada dia; são verdadeiros “com-panheiros” (aqueles com quem parto o pão) da busca por justiça social. Outros, contudo, serão dignos do meu voto pelo simples fato de trilharmos o mesmo caminho, o que nos faz companheiros distantes, mas nunca desconhecidos. Desde cedo minha mãe dizia que não era pra deixar nenhum desconhecido entrar em casa; já que a polis é também minha casa, adotei para ela o mesmo preceito e, por isso, não voto em desconhecido algum – para ser digno do meu voto, é preciso ter o passado limpo e uma atuação exemplar, e não apenas uma coleção de beijos em crianças lindas e fofas, incapazes de protestar contra o ajuste da tarifa de ônibus ou contra a superlotação dos postos de saúde.

Aprendi também que o voto não é um momento singular cujas consequências se alastrarão por quatro longos anos. Penso, antes, ser justamente o contrário: o voto deve ser, ele mesmo, a consequência de tudo aquilo que o candidato fez ao longo não apenas de quatro anos, mas em toda a sua vida, pública e privada, na defesa das minorias, dos injustiçados, dos desvalorizados pela sociedade de consumo. “Voto não tem preço, tem consequência”, diz o slogan do MCCE (Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral); vou mais além, e digo que todo voto deve ser, além de consequente, a consequência ele mesmo de toda uma luta em favor dos pequenos travada muito antes do processo eleitoral. Voto que não é consequência, só pode ser inconsequente.

A você, eleitor – sobretudo a você, jovem eleitor, que está escolhendo seus candidatos pela primeira vez –, faço meus sinceros votos de um bom processo eleitoral e de que, em outubro, você faça uma escolha mais que consciente: uma escolha consequente. Boa política a cada um de nós!
“Ou os estudantes se identificam com o destino de seu povo, com ele sofrendo a mesma luta, ou dele se dissociam, e neste caso, serão aliados daqueles que exploram o povo” (Florestan Fernandes).
Há-braços na caminhada!

Prof. Renato

Filosofia/Sociologia – 1º Ano EM

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